A barriga ronca. O que a gente faz? Come. A gente vai comemorar aniversário, come. A gente vai sair com os amigos, come. Reencontrar a família toda no fim do ano, come pra valer. A gente vai chamar o crush pra sair… Come mais um pouquinho. E se tudo der errado, tem as amigas pra ajudar a acabar com o pote de sorvete. A gente come mais ainda, oras bolas! Já se diz por aí que tudo acaba em pizza. Come de feliz, de triste, de raiva, de tédio (sempre), de ansiedade. Chomp, chomp!
“eu amo comida mais do que eu amo pessoas”
Comer vai além do ditado de que “saco vazio não para em pé”. Quando se come, não se pensa somente em nutrição. Aliás, muitas vezes nem se pensa em nutrição, mas no bel prazer de mastigas e engolir. Hmmmmmm! A comida pode deixar de ser a amiga de todas as horas e se tornar uma grande vilã se for endeusada ou vista como inimiga da boa aparência. Sumir com um hambúrguer entre os dentes tão rápido que mal se lembra do gosto, evitar festinhas de aniversário ou deixar de ir com a galera do trabalho na lanchonete da esquina pra fugir das comidinhas pode ser sintomas de transtorno alimentar. Com tantas manias diferentes de cada um, como saber?
A nutricionista clínica comportamental, Fernanda Timerman, explica que apresentar sofrimento físico, emocional ou social em relação à maneira como come e na sua relação com o corpo; falar muito sobre dieta e sempre tentar algo novo, restringir cada vez mais a alimentação ou apresentar descontrole e se isolar por qualquer problema relacionado ao temor de não ter o que comer são alguns dos sintomas do desenvolvimento de alguma doença relacionada à má alimentação. Antes de se servir é importante orar considerar qual é o motivo pelo qual se está comendo. A psicóloga Fabiola Luciano ergue a pergunta: que fome eu quero alimentar com essa refeição? “Muitas vezes é uma fome emocional que não é suprida por nada que a gente coma”, revela, se referindo aos excessos e restrições extremas. Há vários casos em que o transtorno alimentar tem que ver com algum transtorno psíquico como ansiedade e depressão.
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Atualmente se vive em uma geração que busca comer bem, e de acordo com Fernanda essa procura pode levar ao desenvolvimento de algum transtorno. Inclusive existe nome e sobrenome para a demanda absoluta de comer alimentos “corretos”: ortorexia nervosa. É uma síndrome que pode causar danos sociais, emocionais e clínicos. Ela ainda declara que o equilíbrio na alimentação é o ato de conseguir identificar suas necessidades fisiológicas – a fome do estômago – e reagir mais a ela do que a fome emocional; sempre seguindo a regrinha básica de preferir alimentos naturais, integrais e ter flexibilidade de comer “guloseimas” em eventos sociais esporadicamente.
Foi só depois de experienciar a obesidade, a tão sonhada magreza e um distúrbio alimentar que Erika Elenbaas entendeu que tem muita história para ser contada sobre a forma como lidamos com a comida e com nós mesmos. Hoje ela é desenvolvedora do blog Brigadeiro de Alface, que começou como um desabafo de sua experiência pessoal e atualmente ajuda pessoas a encontrarem equilíbrio na corda bamba entre nutrição e prazer provenientes do alimento.
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O equilíbrio está em algo óbvio: comer bem. Comer bem, por sua vez, é poder comer com moderação e controle. “Um controle natural, e não restritivo ou autopunitivo”, explica Fabiola. Devido a cultura fitness corrente nos últimos tempos, a busca por dietas tem tido repercussões não tão saudáveis. De acordo com a psicóloga, as dietas mais restritivas podem potencializar a compulsão alimentar. “O que acontece é que as pessoas vêm distorcendo o conceito de saúde”, admite. Saúde não quer dizer ter um corpo perfeito. Aliás, perfeição é algo utópico. Fabiola conta que muitos pacientes que estão acima do peso têm mais saúde do que aqueles que o índice de Massa Corpórea (IMC) é considerado ideal.
Foi assim com Erika. Tudo começou quando ela foi para Holanda em 2010 e deu início a uma dieta prescrita por uma nutricionista famosa de lá. A dieta pedia que ela ingerisse no máximo 1.200 calorias por dia. No entanto essa não era uma tarefa fácil de cumprir, por isso quando deslizava em um chocolate aproveitava para chutar o balde naquele dia e comer tudo que desejasse. No dia seguinte, dieta de novo. Começava um ciclo de comer pouco, muito, pouco… Isso aconteceu até se tornar frequente. “Eu me sentia péssima depois disso, extremamente culpada, envergonhada e solitária por não dividir essa dor com ninguém porque eu não tinha coragem”, desabafa.
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A psicóloga Fabiola revela que para manter o equilíbrio nessa questão, é essencial não perder de vista o referencial de si mesmo. “É um exercício diário e naturalmente difícil, porque como seres sociais temos necessidade de aprovação social”, afirma. A especialista acredita que o ideal seja se perguntar até onde essa aprovação é válida para que a pessoa não viva só para os outros. “Quando a gente faz isso, perde de vista quem a gente é, a nossa identidade e se torna só um modelinho que quer se encaixar em algum lugar e isso passa a não fazer sentido”, declara. Para perceber se alguém está indo longe demais, Fabiola conta que é preciso analisar o comportamento e o discurso da pessoa com relação a si mesma e a comida.
A fim de compensar as calorias escapulidas, Erika passava horas na academia para manter o peso, começando um novo ciclo: dieta. Compulsão. Queimar compulsão. De novo. Com a ajuda do esposo procurou ajuda e começou seu tratamento em um centro especializado em distúrbios alimentares lá na Holanda. Ela foi diagnosticada com bulimia, por acontecer compulsão mais de duas vezes por semana seguidas de um tipo de compensação. “Eu achava que bulimia era só pessoas que vomitavam e não é só isso, mas qualquer tipo de coisa que você usa como forma de compensar os excessos da compulsão alimentar, seja exercícios ou algum medicamento”, compartilha. Foram seis meses de tratamento, dos quais ela aprendeu que comer de forma considerada não saudável faz parte e, acredite, é saudável.
“Equilíbrio é viver bem com o alimento” – ELENBAAS, Erika